"Não importa o que faremos de nós. O que importa é o que faremos daquilo que fizeram de nós"
- Sartre
Caprichei
na barba, vesti uma roupa bem bacaninha e joguei a máquina fotográfica na
mochila. Zarpei para o prédio da Justiça, que tem sete
varas cíveis. Fui na 4ª Vara. Não havia audiências. Passei para a 6ª.
Igualzinho. O servidor disse que “era por causa da Copa do Mundo que estava
tudo meio bagunçado”. Na 7ª, a servidora achava que as audiências iam ser
canceladas. Corri para a 1ª. Adivinhem? Segui para a 5ª: só duas audiências (Eu
não compreendo como uma empresa pode funcionar bem se o pessoal trabalha do
jeito e quando quer).
Na porta
da 3ª Vara Cível conheci três estudantes de direito.
Entramos. A moça que iria datilografar os textos chegou atrasada. O juiz, muito gentil e sereno, explicou didaticamente que para
resolver o caso precisava de uma perícia para apurar o grau de incapacidade da
vítima do acidente automobilístico. Em seguida, confessou: _ “Esse tipo de ação
dá demais, aí já tem o control C control V”.
Após
clicá-los, fui para a 2ª Vara. Na mesa, as partes debatiam que valor deveria
ser pago à filha de seis anos de idade: 253 ou 280 reais mensais? O juiz estava
caladinho. Era o promotor quem falava.
Por causa dele, as partes fizeram um acordo em que o pai pagaria 37% do
valor do salário mínimo mensalmente. O Promotor advertiu com voz de paizão: “o
compromisso é sério e pode dar cadeia se não for cumprido”.
Eu fui
de mansinho até o juiz e perguntei se podia tirar fotografias. Ele disparou: _
“Por quê?”. _ Bom, para demonstrar que eu estive aqui, eu disse. Lasquei alguns
cliques consentidos. Eu tinha ouvido falar que o cidadão tinha o direito de
assistir audiências na justiça sem comprar ingresso. É como se fosse uma sala
de cinema, em que a gente podia presenciar dramas em carne e osso. Ver
sentimentos de verdade explodirem era um
espetáculo que ajudava a gente a amadurecer e encarar a vida com outros olhos.
Passado
algum tempo, o juiz mandou que eu me identificasse. Eu perguntei meio assustado:
Por quê? Ele disse em tom inquisitorial: _ o Senhor entra aqui, tira fotos,
assiste a audiência, e por isso precisa dizer quem é! Eu menti: _ Meus documentos
estão no carango. Em pouco tempo chegou o cabo Edson, da Polícia Militar, que,
por ordem do juiz, deveria me acompanhar até o possante para que eu buscasse meu
documento de identidade. Eu não compreendo, sinceramente, o motivo daquele
constrangimento. Senti-me tão intimidado, que um estranho cheiro que as moscas
varejeiras adoram tomou conta do meu olfato.
Em casa, corri para o espelho: eu não vejo em
mim traços sauditas; nem há um olhar ameaçador debaixo das lentes dos meus
óculos; nunca viajei para o Paquistão, nem fiz amizade com islamitas; juro por
Deus, eu não tive nada a ver com o atentado de 11 de setembro de 2011. Eu abasteci
os pulmões com gigantes letras maiúsculas e berrei para toda a vizinhança
ouvir: meu nome é FAN GHÓÓÓÓÓRRRRRR, o blogueiro!!!!!!!!!!